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quinta-feira, 4 de junho de 2009

Escrevendo sobre mim...

Vou relembrar nessas linhas alguns momentos de minha vivência escolar. Iniciarei falando sobre a relação da minha família com a educação.
Na minha casa meus pais pouco falavam sobre a vida escolar deles. Meu pai veio de uma família pobre, sendo caçula de nove irmãos. Meu avô paterno e minha avó pode-se dizer que eram analfabetos funcionais. Meu pai era ainda moleque quando meu avô abandonou minha avó, deixando-a desamparada com nove filhos muito pequenos, e esta para manter a casa lavava roupa de ganho.
Com tantas necessidades os filhos foram à luta muito cedo, inclusive meu pai, que conta que com nove anos de idade vendia cafezinho na Barroquinha. Assim, poucos concluíram o ensino fundamental e médio. Apenas uma tia conseguiu fazer magistério. Meu pai nem concluiu o fundamental I, parando na 4ª serie.
Na família de minha mãe a historia não foi muito diferente não. Meus avôs vieram do interior para Salvador em 1962. Ele só cursou até a 3º serie do fundamental I e ela até a 4ª. Meus tios, apesar das dificuldades, tiveram mais oportunidade de estudar. Apenas minha mãe e duas tias concluíram o ensino médio com curso profissionalizante (minha mãe fez contabilidade). Dos outros seis irmãos, três ainda tentaram, chegando ao ensino médio, mas não concluíram, e os outros três fizeram malmente o fundamental I.
Minha mãe - creio que pelo fato de ter permanecido mais tempo na escola - sempre me incentivou muito, enquanto meu pai queria que eu estudasse, mas não me dava o ‘apoio necessário’.
O processo de alfabetização se iniciou em minha vida antes mesmo de ter adentrado na escola. Recordo-me que minha mãe me ensinava às letrinhas com uma cartilha que continha as letras do alfabeto, desenhos com as iniciais correspondentes para pintar e pontilhados para cobrir escrever.
Não me lembro à idade em que entrei na escola e muitas outras coisas. Devia ter entre 3 e 4 anos. Minha primeira escola foi o Educandário São Marcos e a professora Luzia. A escola era muito pequena. Sentávamos em mesinhas com quatro cadeiras, quando a professora não juntava formando grupo de oito crianças. Repartíamos o lanche no recreio.
Passei a morar em Jardim Nova Esperança. Bairro pobre de Salvador, com algumas invasões, na época, ainda pouco povoado. Entrei na Escolinha Nossa Senhora do Carmo, tendo com professora Maria das Neves - Nevinha para os alunos.
Era uma escola muito pequena, apenas dois vãos no segundo andar, parede meia com a casa da professora. De telhas, com aquelas cadeiras com braços enfileiradas quadro de giz, filtro de barro, paredes gastas, mas coloridas, enfeites pendurados nos barrotes entre as telhas. Estudava de tarde. Lembro-me que quando passava no rádio - não tínhamos televisão ainda - o programa Sociedade Contra o Crime da Radio Sociedade da Bahia, eu ia direto para o banheiro me arrumar.
A professora era exigente no conteúdo. A concepção de ensino que ela se baseava - pelo menos conforme as ações - era a tradicionalista, em que ‘o professor é o centro e o aluno um mero receptor e reprodutor de informações’. Não havia contextualização dos conteúdos e os alunos pouco interagiam uns com os outros e com a professora, pois momentos assim não eram propiciados.
Não me recordo com clareza os métodos usados, a não ser um livro em que tomava nossa lição com aqueles textos descontextualizados do tipo:
“Bia viu a bola.
A bola é de Bia.
Bia brinca com a bola.”
Não me lembro de ter presenciado momentos lúdicos, a não ser nas datas comemorativas. Talvez por falta de espaço ou por falta de conhecimento da professora acerca da importância desses momentos para o desenvolvimento da criança, principalmente o simbólico.
No recreio mal podíamos levantar do lugar, pois não tinha espaço. Porém, no final do ano a maior parte dos alunos saia da escola sabendo ler. Não recordo a metodologia usada, mas funcionava.
Estudei lá até a primeira serie que lá não tinha, mas minha mãe ‘amou’ o ensino da professora e insistiu com ela para que me ensinasse. Ela o fez. No final do ano, pegou a transferência de outra escola e me deu, pois a escolinha não era registrada.
Os anos em que passei na Nossa Senhora do Carmo foram muito difíceis. Minha mãe, quando eu tinha cinco anos e meu irmão 3,5 abriu mão de seu emprego para ficar conosco. Eu ficava um pouco triste, pois sempre que as atividades da escola dependiam do dinheiro, geralmente não participava.
Um dia, uma fala da professora me marcou. Se não me falha a memória era o dia das crianças. A maioria dos pais tinha contribuído para a compra de uma lembrancinha. Os meus não puderam. No final da aula, a professora me chamou e me disse: --“Olhe aí o seu! Mesmo seus pais não dando o dinheiro nós compramos para você!”
Aquelas palavras de modo irônico - penso que sem refletir nas conseqüências -, da professora me deixaram constrangida perante os colegas. Mesmo que eu tenha gostado de ganhar aquele fogãozinho de plástico!
Passando para 2ª serie, fui estudar no Colégio Cata-Vento, hoje, Colégio Olimpius (particular). Era um dos melhores colégios do bairro. Tinha uma estrutura razoável: uma quadra pequena, dois banheiros, e uma simples cantina. Quando saí de lá na 5ª serie tinha acabado de construir uma pequena piscina, que não cheguei a desfrutar, pois a diretora alegou que nossa turma foi a pior do colégio - creio que pelo comportamento -, e não lecionaria mais para essa serie. De fato, a minha turma foi a ultima do colégio até a presente data!
Com dificuldade meu pai comprou meus primeiros livros de gramática e matemática, que vinham acompanhados com pastinhas de atividades complementares. A sala ficava no segundo andar e a turma era cheia. O nome da professora era Lilian. Não me recordo de detalhes dessa fase escolar: do ensino, das brincadeiras – se existiram -, dos métodos.
O único fato de que tenho lembrança foi uma peça-cantada que apresentamos no folclore. A música foi a ‘Bela Rosa Juvenil’. Segue a letra:
“A bela Rosa juvenil, juvenil,
Vivia alegre no seu lar, no seu lar,
Um dia veio a Bruxa má, Bruxa má,
E adormeceu a Rosa assim, bem assim.
O tempo passou a correr, a correr,
O mato cresceu ao redor, ao redor,
Um dia veio um belo Rei, belo Rei,
E despertou a Rosa assim, bem assim,
E demos viva ao nosso Rei, nosso Rei!”
Eu fui a Rosa! Estava morrendo de vergonha ao dançar na frente de todo corpo escolar. Era minha primeira vez em cena, mas ficou muito lindo!
Na 3ª e 4ª série, minha professora foi Maria de Fátima. O ensino era predominantemente tradicional. Estudávamos conceitos, gravávamos fórmulas e na hora da avaliação reproduzíamos. Os alunos interagiam apenas em atividades em grupos ou no recreio. Momentos lúdicos só em datas comemorativas. Não recordo da presença de jogos educativos.
Segundo a autora Maria de Lucia Arruda Aranha, “espera-se que o profissional da educação seja um sujeito critico, reflexivo, um intelectual transformador, capaz de compreender o contexto social-econômico-político em que vive”.
Isso se refere ao fato do professor, sabedor que o espaço escolar não é neutro, buscar despertar nos alunos a criticidade. Agindo dessa forma, o professor evitará que a escola – como teoriza Althusser (In Tomaz Tadeu da Silva, p 03) – seja um mero Aparato Ideológico do Estado para a reprodução das classes sociais.
Cheguei na 5ª serie na mesma escola. Os professores agora eram muitos. Mais ou menos seis. Não tínhamos um laboratório de informática que comportasse a quantidade de alunos, nem laboratório de química. Às vezes éramos oportunizados a fazer experiências, mas para tal usávamos a criatividade, pois não tínhamos materiais adequados.
O ensino religioso era interconfessional, mas com ênfase no catolicismo. Não era considerado importante como outras disciplinas como português e matemática. Parecia enchimento de currículo. Assim também a Educação Física. Não era valorizada, mas vista como um passatempo. O professor se esforçava, pois víamos o empenho dele.
Passando para a sexta serie fui estudar no Colégio Municipal Professor Alexandre Leal Costa, na Mouraria, bairro de ‘classe média’. Ali passei os três anos seguintes de minha vida escolar – 6ª, 7ª e 8ª séries.
Nesse colégio, o ensino era muito bom, tinha marcas da escola tradicionalista, mas éramos incentivados a pesquisar, trabalhar em grupos, havia contextualização dos conteúdos, o professor não era distante do aluno, nem o centro da aprendizagem – havia interação.
Tinha uma biblioteca, na qual pegávamos livros emprestados para ler, um laboratório de informática, no qual fui monitora por alguns meses. Havia festival do meio ambiente, gincanas, sábado verde, no qual fazíamos caldeirões de saladas de folhas e desfrutávamos da companhia uns dos outros. Tinha também visitas ao teatro, a lugares turísticos da cidade. O lúdico agora se fazia mais presente, porém ainda não era reconhecido em sua importância.
O espaço físico na escola não era muito favorável, pois era um daqueles casarões antigos readaptados. A direção era bem próxima dos alunos. Ouvia seus questionamentos, opiniões. Os pais também eram presentes. Havia interação entre a comunidade escolar.
Foram marcantes os anos em que passei nessa escola. Apesar das dificuldades que muitas vezes enfrentávamos como falta de material para a realização de algumas atividades, havia uma harmonia na escola. Os professores eram excelentes e se esforçavam para o aprimoramento do ensino.
Em 2005, fui cursar o segundo grau no Colégio estadual Ypiranga. Escola localizada no dois de Julho. Havia contrastes entre a comunidade que morava ao redor da escola: entre apartamentos e carros de luxo, casas muito humildes, pessoas muito pobres, muitas crianças de rua, mendigos, andarilhos, usuários de drogas.
No primeiro ano tive dificuldades pela falta de professores, o que dificultou o aprendizado. Nessa época tive três professores de biologia e três de física - estagiários.
O segundo ano correu tranqüilo. A educação física não era realizada nesse momento da escolarização. Na maioria das vezes os alunos ficavam dispersos e cada um fazia o que queria: um grupo jogava bola, outro pulava corda, outro simplesmente ficava na sala conversando. Não havia orientação da professora, que faltava muito. Raramente o lúdico se fazia presente nas atividades.
Senti muita dificuldade em redação, pois foi a primeira vez que tive o contato com a dissertação. Fui acostumada desde o fundamental a escrever narrações e não discutir e argumentar idéias. A professora Léa Santiago, de língua portuguesa, nos incentivava a ler. Ela falava com tanta veemência e fascinação dos livros, que encantávamos e sentíamos convidados a lê - los.
Nos dois anos em que ela me lecionou li Dom Casmurro, o Cortiço, Memórias de um Sargento de Milícia, Senhora, Clara dos Anjos entre outros tantos e debatíamos nos seminários. A professora Léa fez a semana literária nos dois anos em que lecionou. Foi muito proveitosa essa atividade. Fazíamos peças, exposições.
Muitos dos trabalhos de pesquisa que faziam eram interdisciplinares. Dois desses trabalhos marcaram: o primeiro se intitulava ‘Uma forte ligação com Salvador’, que envolvia as disciplinas Língua Portuguesa, Historia e Geografia. Visitamos os quatro fortes principais de Salvador, estudamos sua importância histórica para a cidade e apresentamos uma exposição de fotos e um relatório.
O segundo trabalho se intitulava ’Nas trilhas do litoral norte’, em que as disciplinas de Geografia, Historia, Língua Portuguesa e Biologia se articulavam. Visitamos a Praia do Forte, a Reserva de Sapiranga, o Castelo Dias D’Ávila e o Projeto Tamar. Depois da visita fizemos um relatório de pesquisa e apresentamos uma exposição de maquetes e fotos.
Na escola também tínhamos visita de palestrantes que tratavam dos mais diversos temas. Uma das coisas que fazia falta era o verde. Pelo fato de ser um monumento histórico tombado, não tinha uma arvore sequer.
Os métodos de ensino saiam um pouco do tradicionalismo – livresco. Os professores trabalhavam com slides, filmes, discussões e as respostas das atividades não precisavam ser copias do livro. Éramos incentivados a ler, discutir, e escrever.
Recordar as vivências escolares e registrá-las foi de grande importância para mim, por que se trata da formação de uma futura docente. Através da escrita, pude perceber o que era no passado, como o processo de aprendizagem ocorreu, como contribui para minha formação, quem penso e quero ser no futuro como profissional da educação.
Assinado... Lola♥